O Governo Bolsonaro destinou para a compra de tratores R$ 89,8 milhões que deveriam ser direcionados para minimizar os impactos da pandemia em comunidades pobres. Os tratores foram adquiridos pelo Ministério da Cidadania no âmbito de uma operação voltada para famílias de extrema pobreza da zona rural. As informações foram divulgadas pela Folha de S. Paulo nesta segunda-feira (23).
A compra de 247 equipamentos foi efetivada no ano passado, no apagar das luzes, antes mesmo de o Ministério da Cidadania definir a relação de cidades beneficiadas. Nos últimos meses, foram divulgados casos de compra de tratores envolvendo o orçamento secreto, a diferença agora é que agora os recursos são do próprio orçamento da União.
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Em junho, o TCU (Tribunal de Contas da União) autorizou que sobras de orçamento resultantes da transição do programa Bolsa Família para o Auxílio Brasil pudessem ser liberadas. A decisão ocorreu após pedido do Ministério da Cidadania. No entanto, a Corte condicionou a utilização dos recursos.
Segundo o acórdão do TCU, o dinheiro “deverá ser direcionado exclusivamente ao custeio de despesas com enfrentamento do contexto da calamidade relativa à pandemia de Covid-19 e de seus efeitos sociais e econômicos e que tenham a mesma classificação funcional da dotação cancelada ou substituída”.
Entretanto, o governo de Jair Bolsonaro (PL) ignorou as duas regras: os gastos não têm relação com a Covid e as compras são de investimentos, não de custeio. A relação entre as compras de tratores e o combate à Covid também tem sido questionada internamente por técnicos da pasta.
O crédito suplementar veio em 3 de novembro, em portaria do Ministério da Economia. A verba foi vinculado à ação orçamentária “20GD- Inclusão Produtiva Rural”. É nessa rubrica que está o programa Fomento Rural, que sempre foi operacionalizado em duas vertentes: apoio técnico aos agricultores e transferência de dinheiro para as famílias, sempre com foco na população rural pobre, inscrita no Cadastro Único.
Em março, João Roma, então ministro da Cidadania, assinou a portaria 755, que instituiu uma chamada Estrutura de Mecanização Agrícola (MAG-SAN) no Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). Não houve qualquer publicidade sobre a nova medida. O ato diz que os equipamentos devem ser usados para ações como preparo do solo, semeadura, plantio, aplicação de adubos e fertilizantes, colheita e escoamento.
A pasta só estabeleceu a quantidade de equipamentos por estado. O maior beneficiado é a Bahia, do próprio João Roma, que hoje pré-candidato ao governo estadual pelo PL, mesmo partido de Jair Bolsonaro (foto).
João Roma afirmou à Folha que não houve desvio de finalidade na utilização dos recursos, já que a compra de máquinas agrícolas é uma ação que integra a área de fomento rural e que, portanto, atende as pessoas do programa. Ele também negou que tenha privilegiado a Bahia e disse que a escolha se deu por critérios técnicos, entre eles o tamanho do território e da população baiana.