Marcellus Ribeiro
Secretário de Fazenda do Maranhão, Marcellus Ribeiro avalia como a política de preços da Petrobras tem encarecido o valor do combustível. Foto: Reprodução

Em entrevista ao Diário 98, o secretário de Fazenda do Maranhão, Marcellus Ribeiro Alves, critica o aumento dos preços dos combustíveis desenvolvido pela Petrobras, ao relembrar que os estados têm mantido o ICMS aos patamares mesmo de antes da pandemia.

Desde o início da crise econômica, como consequência da pandemia de Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro tem terceirizado a responsabilidade do crescente aumento no preço dos combustíveis e também da carestia dos alimentos. Só a gasolina teve aumento de 51% ao longo do ano de 2021 e a probabilidade é que os valores dos combustíveis cresçam ainda mais. A inflação dos últimos dose meses, segundo o IPCA, atingiu 10,2%.

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Para Marcellus, o clima político caótico, patrocinado pelo Chefe do Executivo, contribui para a desvalorização do real frente a outras moedas do mundo.

“Então quando o preço do arroz disparou, a culpa era dos supermercados que estavam estocando o produto; quando o preço da gasolina aumentou, a culpa era dos estados que estavam aumentando a tributação desse combustível. Então é uma omissão que tende a transferir a culpa para terceiros, quando todos os instrumentos da política macroeconômica pertencem constitucionalmente à União”, afirma.

Antes de integrar a secretaria do governador Flávio Dino (PSB), Marcellus Ribeiro foi auditor fiscal, superintendente adjunto da Receita Federal 3ª Região Fiscal (Ceará, Maranhão e Piauí). É bacharel em economia pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), em direito pela Faculdade São Luís e pós-graduado em direito tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul).

Marcellus afirma que hoje o Maranhão aporta entre 10% e 11% de sua receita em investimento, que teriam como resultado em números positivos em relação a novos empregos no Estado.

De acordo com os dados divulgados em janeiro deste ano pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério da Economia, São Luís foi a segunda cidade brasileira que mais criou postos de trabalho com carteira assinada em 2020. Ao todo, foram criados 10.334 novas vagas na capital maranhense durante a pandemia de Covid-19.

No ranking das cidades que mais criaram vagas, São Luís só fica atrás de Manaus, que gerou 10.869 postos de trabalho. Atrás da capital maranhense, aparece Baureri (SP) com 8.798 vagas, Paraupebas (PA) com 8.579 e Cajamar (SP) com 7.610.

“Quando a gente fala em geração de emprego a gente tá falando em dignidade para as pessoas”, afirma Marcellus, que concedeu a entrevista ao D98 na última sexta-feira (24) por intermédio do aplicativo zoom.

Diário 98: De quem é a culpa por essa alta de preços nos combustíveis?

Marcellus Ribeiro: Os estados, as unidades da federação não fizeram ajuste de alíquota que pudesse representar um aumento de carga tributária dos combustíveis. Desde 2018 e 2019 a carga tributária sobre os combustíveis é a mesma. Então atribuir aos estados essa elevação de preços não é correto, principalmente porque essa alta generalizada que temos é constante em todos os produtos, inclusive produtos da cesta básica: arroz, feijão e carne. Então esse é o primeiro dado importante pra gente entender essa questão toda.

De forma bem objetiva, o que é responsável hoje pelo aumento do preço do combustível é a política de preço desenvolvida pela Petrobrás a partir de julho de 2017, vinculando ao preço vinculando o preço dos combustíveis do mercado nacional ao preço praticado no mercado exterior. E segundo, a variação cambial, a desvalorização brutal que nós temos hoje na nossa moeda nacional, das moedas que mais desvalorizaram nos últimos anos. Por que há essa desvalorização? Porque há uma descrença no futuro da economia. Todo esse caos político que traz a insegurança para os investidores, que preferem tirar os seus investimentos do Brasil. A saída do dólar, uma fuga de dólares do mercado nacional. Aí fica o dólar atrelado à lei da oferta e da demanda: sai muito dólar, a pouca oferta de dólar no mercado nacional faz com que haja essa elevação.

E aí a reboque disso você tem a elevação do preço dos combustíveis e de outros produtos. Vou citar, por exemplo, o caso do arroz. O Maranhão tem uma tradição na produção de arroz. O arroz precisa de fertilizantes, que em regra você vai comprar no mercado internacional, em dólar, então você tem um custo maior para a produção de arroz, que evidentemente é repassado ao consumidor.

Então ao contrário do que se afirmou no passado, porque há sempre uma lógica de culpar o outro e de não assumir a responsabilidade pelos erros. Então quando o preço do arroz disparou, a culpa era dos supermercados que estavam estocando o produto; quando o preço da gasolina aumentou, a culpa era dos estados que estavam aumentando a tributação desse combustível. Então é uma omissão que tende a transferir a culpa para terceiros, quando todos os instrumentos da política macroeconômica pertencem constitucionalmente à União.

A inflação está subindo. O preço dos alimentos dispararam. O que explica essa situação?

Se deve à ausência de uma política econômica consistente, que faz com que nós tenhamos uma desvalorização muito grande no câmbio, da nossa moeda nacional.

Atrelado a isso você tem uma elevação da taxa de juros, que é o que está sendo sinalizado agora no momento pelo mercado. Você tem que manter essa taxa de juros elevada para remunerar o investimento estrangeiro, porque senão o investimento estrangeiro não vai permanecer no Brasil.

E aí a tendência do real se desvalorizar mais ainda. Então, a elevação de taxa de juros e uma desvalorização brutal do câmbio são responsáveis pela essa alta generalizada que nós temos, não só o combustível, em todos os produtos nós temos uma elevação constante nos preços e a população evidente tá pagando essa conta.


A Alcoa anunciou a reativação de sua planta de alumínio gerando cerca de mais ou menos 2 mil empregos diretos no Maranhão. O governo do estado teve alguma participação nesse processo?

Tem à medida que a concessão de benefícios e de incentivos fiscais incentivam para que haja essa retomada da produção, mas é evidente também que é uma questão econômica relacionada ao mercado externo, não é só o incentivo fiscal. Há todo um cenário externo mais favorável para que haja retomada dessa produção.

Você tem o montante desses benefícios fiscais concedidos pelo governo e como isso ajuda na geração de emprego?

Hoje no caso específico da Lei de Incentivo ao Desenvolvimento Industrial do Maranhão, o benefício fiscal vai de 75% até 95% de redução do ICMS.

Esses incentivos fiscais que foram concedidos, houve uma mudança na política de incentivos a partir de 2015. Ele ajuda a minimizar o principal problema que nós temos hoje na economia, significa geração de emprego e renda. Temos o desemprego batendo a cerca de 15 milhões da população. Se você multiplicar por 4 a perda de emprego, uma família que tem em média quatro pessoas, teríamos 60 milhões de pessoas desempregadas. Então é um dado preocupante, 15% da população desempregada. Num momento de muita tensão social, e política, é o dado que para mim é sempre preocupante.

Então nós conseguimos com essa política de incentivo fiscal minimizar o desemprego. Nós temos tido desempenhos bem positivos no Caged ao longo desses anos, que a gente atribuí a dois fatores. Primeiro, a política de incentivo fiscal. E segundo, mas talvez mais importante, que é o nível de investimento público no que é realizado hoje pelo Governo do Estado do Maranhão. Então nós temos o segundo do Nordeste, no terceiro ou quarto nível de maior investimento público do Brasil.

Quando eu falo de investimento púbico, estou falando em relação a nossa receita corrente líquida, que é hoje de 11%. Então, nós investimos 11% da receita corrente anualmente. É evidente que isso traz uma retomada do emprego, principalmente porque esse investimento é direcionado para a infraestrutura.

Então o investimento em infraestrutura tem um multiplicador keynesiano, ou seja, a capacidade de se reproduzir é muito grande, três, quatro vezes mais. De um modo geral, porque valorizamos esses incentivos, sempre exigindo contrapartidas por parte daquele que recebeu o benefício, contrapartidas sociais. Boa parte dos nossos incentivos estão vinculados à geração de empregos.


Hoje o Maranhão possui uma das maiores taxas de investimento público do país. Como que isso é possível dado o cenário de dificuldades econômicas do Brasil frutos da pandemia?

Nós reorganizamos, principalmente a partir de 2015, reduzindo as despesas supérfluas e por outro lado houve um rearranjo de todos os incentivos fiscais no Estado. Até 2014, tínhamos muito incentivos fiscais direcionados para CNPJs, então às vezes só uma pessoa de um segmento econômico tinha o benefício fiscal. E muitas vezes não era conhecido, não eram publicados esses incentivos, não eram dados por lei, muito menos publicado no Diário Oficial.

Então nós modificamos essa lógica, porque é evidente que, se esse incentivo fiscal traz o desenvolvimento de uma empresa ou a geração de emprego para uma empresa a gente deve estender para tornar isso público. Então nós modificamos, passamos a conceder incentivos para todos. Fizemos um estudo daqueles incentivos que realmente traziam alguma resposta positiva para a população do estado, reorganizando aqueles que eram importantes e ampliamos para o segmento, e não para uma pessoa jurídica apenas.

E isso é evidente trouxe resultados, principalmente em geração de empregos. De fato, isso hoje é a maior preocupação do governador Flávio Dino, a maior preocupação nossa é a geração de emprego. Nós não conseguimos conceber economia como um dado. Quando a gente fala em geração de emprego a gente tá falando em dignidade para as pessoas.

Os números de geração de emprego do Maranhão mensurados pelo CAGED têm sido bem positivos. O senhor atribui a essa reorganização aos incentivos fiscais como um dos vetores de retomada dessa melhora ou tem algo além disso?

Além dos incentivos fiscais, eu considero na ordem de importância que o investimento acima de 10% a 11% da receita como o principal responsável por essa geração de emprego. Dado o efeito multiplicador e positivo que tem sobre toda a economia. E claro a organização, o direcionamento de toda a atividade empresarial.

Por fim, como o senhor observa atualmente o clima social-econômico do país?

Eu tenho particularmente uma preocupação muito grande com o que está acontecendo no país. Muito conflito político sendo alimentado pelo próprio governo federal, ou seja, alimentando conflitos. Um clima social de perda de emprego.

Eu vi uma invasão, uma ocupação bolsa de valores, de pessoas desempregadas, pessoas desesperadas, angustiadas com essa situação. Então é algo que a gente pode ter de forma recorrente.

Se nós não mudarmos, se o governo federal não passar a utilizar os instrumentos de política macroeconômica que possui a gente vai acirrar ainda mais esses conflitos, porque o terreno está fértil, 15% da população desempregada é um terreno muito fértil para esse tipo de situação. Então é preciso que o próximo Governo Federal tenha muito cuidado com a política econômica, inflação, desemprego e juros altos é uma forma explosiva.