Em 2022, o nome de Maribel Schmittz Golin surgiu discretamente entre os maiores financiadores da campanha de Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao governo de São Paulo. Pecuarista, herdeira de um clã com milhares de hectares de terras espalhadas pelo Brasil e sócia de empresas ligadas ao agronegócio e à energia, ela doou R$ 500 mil em duas transferências para o então candidato, tornando-se sua sexta maior apoiadora. Mas, por trás desse aporte aparentemente legítimo, havia uma teia de negócios que agora coloca Maribel no centro de uma das maiores investigações financeiras em curso no país: a Operação Mafiusi, da Polícia Federal, que rastreia lavagem de dinheiro do Primeiro Comando da Capital (PCC).

O elo com o “Concierge do PCC”
O relatório da Polícia Federal relaciona diretamente Maribel ao operador logístico da facção, Willian Barile Agati, conhecido como “Concierge”, acusado de ser o elo do PCC com a máfia italiana ’Ndrangheta. Os investigadores identificaram pelo menos quatro transações financeiras entre Agati e empresas controladas por Maribel, que somaram R$ 3,5 milhões. Uma delas chamou mais atenção: a venda de um imóvel em Santo André, registrada por R$ 3 milhões, valor 240% acima do preço venal. Para os agentes, tratava-se de uma típica operação de lavagem de dinheiro, em que o bem é superfaturado para “esquentar” valores ilícitos.
O império construído sobre a falência da Boi Gordo
Para entender o peso de Maribel na economia e na política, é preciso voltar ao início dos anos 2000. A família Golin, originária de Ibirapuitã (RS), expandiu-se nacionalmente a partir de 2003, quando Joselito Golin, marido de Maribel — que também se apresenta em diferentes ocasiões como Paulo Golin — adquiriu a massa falida da Fazendas Reunidas Boi Gordo.

Nos anos 1990, a Boi Gordo havia protagonizado um dos maiores escândalos financeiros da história brasileira. Estruturada como um esquema de pirâmide, a empresa prometia lucros rápidos a investidores por meio da engorda e abate de bois. Mais de 30 mil pessoas foram lesadas, incluindo celebridades como Marisa Orth, Vampeta, Felipão e até o ator Antônio Fagundes, que estrelava propagandas da companhia em horário nobre. Quando quebrou, deixou um passivo de R$ 2,5 bilhões.

O que deveria ter sido um processo de recuperação judicial transparente, tornou-se mais uma oportunidade para o clã Golin expandir seus negócios. Um relatório do Ministério Público de São Paulo concluiu que a família desviou R$ 612 milhões em bens da massa falida, aplicando os recursos na compra de novas fazendas em regiões onde a terra era mais barata, especialmente no Matopiba — fronteira agrícola formada por Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
Hoje, segundo dados do Incra e do Cadastro Ambiental Rural (CAR), a família Golin controla ao menos 69 propriedades rurais, que somam 229 mil hectares em Tocantins, Piauí, Bahia, Mato Grosso e São Paulo. Quando incluídas áreas adquiridas indiretamente ou por parceiros, como o fundo Vision Brazil Investments, esse número pode chegar a 312 mil hectares — o equivalente a duas vezes o município do Rio de Janeiro.
Boa parte das terras foi registrada em nome de Maribel e das filhas Judiliane Golin Loureiro e Ana Paula Schmittz Golin de Freitas. Outras em nome de Paulo Roberto da Rosa, apontado em investigações como uma identidade falsa usada pelo próprio Joselito. O suposto laranja nunca teve documentos reconhecidos pela Justiça Eleitoral ou por cadastros oficiais, mas aparece em registros patrimoniais milionários.
Multas ambientais e crimes no Cerrado
O império dos Golin também acumula um histórico de crimes ambientais. No Tocantins, a Fazenda Eldorado, em Mateiros, sobrepõe 165 hectares de área de preservação da Serra da Tabatinga. Em 2012, fiscais do Ibama constataram o desmatamento irregular de 5.076 hectares de Cerrado, aplicando uma multa de R$ 7,042 milhões à empresa Eldorado Agroindustrial, controlada pelas filhas de Maribel. A mesma empresa possui ainda 27 hectares embargados em Paranã (TO).
No Piauí, a Bom Jardim Empreendimentos Rurais, também ligada às filhas, acumula R$ 223 mil em multas ambientais por descumprimento de embargo em 7.731 hectares desmatados no município de Bom Jesus. O Ministério Público abriu inquérito contra a família, arquivado em 2022. Somadas, apenas essas duas empresas já receberam mais de R$ 7,2 milhões em autuações ambientais.
Em resposta, o grupo Golin afirma que parte das multas foi suspensa judicialmente e que outras foram consideradas improcedentes.
O salto milionário da JBT e a ligação com Gusttavo Lima
Em paralelo às fazendas, Maribel também se projetou no setor empresarial urbano. Em 2018, tornou-se sócia da JBT Serviços, Organização e Gestão Financeira Ltda, que, em 2019, mudou de nome para JBT Empreendimentos e Participações Ltda.
Essa empresa, discreta e com capital social modesto, ganhou os holofotes em 24 de junho de 2022, quando recebeu R$ 57,5 milhões da Balada Eventos, empresa do cantor e pecuarista Gusttavo Lima. O “Embaixador do Agro” afirmou que a quantia correspondia à compra de uma aeronave.

Naquele momento, o capital social da JBT era de apenas R$ 72,4 mil. Poucos dias depois, em 4 de agosto de 2022, houve um aumento explosivo: a empresa passou a declarar R$ 27,4 milhões, um salto de 37.833,48%.
A cronologia dos fatos intriga investigadores:
- 24/06/2022: repasse de R$ 57,5 milhões da Balada Eventos à JBT;
- 04/08/2022: aumento repentino do capital da JBT para R$ 27,4 milhões;
- 26/08/2022: Maribel doa R$ 100 mil à campanha de Tarcísio;
- 26/09/2022: funda a Agro Globo Cereais, em Itapetininga, no mesmo endereço da antiga sede da Boi Gordo;
- 06/10/2022: faz segunda doação a Tarcísio, de R$ 400 mil;
- 30/10/2022: Tarcísio é eleito governador de São Paulo.
Em novembro, após a vitória de Tarcísio, Maribel criou a Green Investimentos e Participações, na qual figura como única sócia.

Stall Energy e a aproximação com o governo Tarcísio
Outro braço do grupo é a Stall Energy, fundada em 2021 com foco na geração de energia a partir de resíduos urbanos. Em janeiro de 2023, Maribel e a Green Investimentos tornaram-se sócias da Stall, já sob o governo Tarcísio.
Em agosto de 2024, a fábrica da Stall em Boituva recebeu a visita oficial do secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo, Jorge Lima, que foi recebido por Joselito Golin, marido de Maribel.
As investigações e a defesa
Em março de 2025, a PF revelou em relatório que identificou R$ 1,4 bilhão em transações suspeitas ligadas a Maribel e às suas empresas entre 2020 e 2022. No final de 2024, a Operação Mafiusi havia sido deflagrada justamente para rastrear a lavagem de dinheiro do PCC em negócios de fachada.
O grupo Golin nega as acusações. Em nota, afirma que a negociação com Willian Agati foi realizada de “boa-fé” e que a Justiça reconheceu a capacidade econômica da JBT para a operação. Sobre o aumento de capital social, diz tratar-se de estratégia de mercado, sem relação com política. Quanto às autuações ambientais, garante que a maioria foi suspensa ou anulada judicialmente.A pecuarista que financiou Tarcísio, movimentou milhões com Gusttavo Lima e é investigada pela PF por lavar dinheiro do PCC.
ÍNTEGRA DA NOTA DE POSICIONAMENTO DO GRUPO GOLIN
O Grupo Golin tem 35 anos de atuação e relevância nacional, com fazendas em 8 estados, gerando milhares de empregos e fornecendo soja, milho, algodão e gado para as maiores empresas do país. Suas coligadas patrimoniais administram participações societárias e negociam áreas rurais, imóveis próprios e bens móveis. As movimentações financeiras do grupo, portanto, são proporcionais ao seu volume de negócios.
As empresas do Grupo e seus representantes não têm qualquer relação com as pessoas que agora enfrentam acusações criminais no Inquérito Policial. O processo em questão está sob sigilo, mas a Justiça Federal já reconheceu que a negociação foi feita de boa-fé, de forma lícita e regular e que a empresa da qual Maribel Golin é sócia tinha capacidade econômica para a transação. Os autos dos Embargos de Terceiro Criminal n.º 5058194-36.2022.4.04.7000 tramitaram na Justiça Federal de Curitiba com segredo de Justiça e tiveram trânsito em julgado.
O aumento de capital social da empresa JBT Empreendimentos e Participações — devidamente registrado nos órgãos oficiais —; a atuação da Stall Energy, voltada para o meio ambiente; e as parcerias rurais em empreendimentos na Bahia e em Mato Grosso têm todos motivos estratégicos de mercado, em nada relacionados a governos ou política.
O Grupo Golin repudia a prática de grilagem de terras, à qual inclusive teve de resistir com o uso de segurança privada depois que propriedades no Piauí foram alvo de invasões por um grupo de grileiros.
Do mesmo modo, as empresas do Grupo vêm cumprindo as exigências da legislação de preservação ambiental e dos órgãos reguladores. A autuação recebida pela Eldorado Agroindustrial, no Tocantins, foi suspensa pela Justiça e o auto de infração ambiental lavrado no Piauí foi julgado improcedente ainda na esfera administrativa.
Assessoria de Imprensa do Grupo Golin